Por Pr. João
Barbosa
O declínio do Papado
– Entre os séculos XIV e XV, a igreja medieval começou a enfrentar uma série
de crises que preparara o caminho para a Reforma Protestante.
A
primeira dessas crises desafiou a base da autoridade eclesiástica, representada
pelo papa e pelos Concílios.
Em 1302,
o papa Bonifácio VIII (1235-1303) promulgou uma bula em que afirmava que todo o
poder espiritual e temporal pertence aos pontífices romanos, decidindo, assim,
que qualquer pessoa que quisesse obter a salvação tinha de submeter-se ao papa
e sem submissão ninguém poderia fazer parte da igreja.
O Império Bizantino que dominou o Oriente durante quase dez séculos,
herdeiro e extensão do antigo Império Romano, chegou ao fim no ano de 1453.
Já nos séculos XII e XIII, o Império Bizantino dava seus primeiros
sinais de enfraquecimento, com as cruzadas e a ascensão comercial das cidades
italianas, acontecimentos responsáveis por sua desestruturação.
Ainda assim, Constantinopla era, até o momento de sua queda, uma das
cidades mais importantes do mundo, funcionando como uma ponte para as rotas
comerciais que ligavam a Europa à Ásia por terra, sendo o principal porto nas
rotas entre o mar Negro e o mar Mediterrâneo.
Em abril de 1453, o exército do sultão Maomé II (1432 – 1481), com cerca
de 80 mil homens, artilharia pesada e mais de 100 navios, sitiou a cidade.
Constantinopla era defendida por 7 mil soldados e cerca de 20 navios.
Mesmo com os bizantinos conquistando duas vitórias animadoras, não conseguiram
resistir ao cerco e ao ataque final, que ocorreu em 29 de maio de 1453.
Já com tropas mulçumanas dentro da cidade, tendo ultrapassado as
muralhas, o momento final do cerco se deu quando, após a queda dos muros da
cidade, o imperador Constantino XI Paleólogo (1404 – 1453), com espada em
punho, partiu para o combate corpo a corpo, para nunca mais ser visto.
A queda de Constantinopla teve grande impacto no Ocidente. A trágica
queda da grande cidade, perante os turcos e otomanos, marcou o fim da Idade
Média e o início de uma nova era chamada Renascença.
De acordo com alguns autores, o Renascimento
(Renascença) foi um movimento de ruptura, que surgiu em oposição à
"escuridão cultural e intelectual" verificada na Idade Média.
Enquanto alguns autores defendiam que o
Renascimento foi um movimento de separação de muitas filosofias da época
medieval, outros indicam que foi um movimento de continuidade e que por isso
está inevitavelmente relacionado com a Idade Média.
A Renascença permitiu o surgimento de gênios
como Miguel Ângelo, Leonardo da Vinci, Nicolau Copernico entre outros que contribuíram
com a invenção de instrumentos científicos com a inovação na arquitetura, na
escultura, na pintura e na música.
A Renascença e a
Reforma Protestante – A época que antecedeu a Reforma Protestante foi de grande inquietação,
um período marcado por muitas mudanças na cultura e na sociedade, assinalando o
final da Idade Média e o início da Idade Moderna.
Entre as mudanças as mais dramáticas foram: decadência do poder feudal e
o fortalecimento do poder nacional representado pelo rei; florescimento urbano,
ocorrido na transição do feudalismo para o capitalismo.
Nesse novo sistema econômico, os meios de produção e distribuição
pertencem à propriedade privada e têm fins lucrativos, e as decisões sobre
oferta, preço, distribuição e investimentos não são feitas pelo governo.
Os lucros eram granjeados pelos proprietários, que investiam em empresas
e estas pagavam aos trabalhadores os salários.”
Essa era, que começou em meados do século XV, ficou conhecida como
“Renascença”, em virtude da redescoberta dos valores culturais da Antiguidade
Clássica.
Tais redescobertas nortearam as mudanças ocorridas nesse período,
trazendo à tona um ideal humanista que afirmava a dignidade do homem, fazendo
deste um investigador da criação.
De fato, foi um tempo de grandes descobrimentos, mas também de disputas.
Imperadores, reis generais e papas lutavam entre si.
Assim foi moldada a Europa moderna e deu-se início à criação dos estados
nacionais.
A era dos
descobrimentos – Com a cidade de Constantinopla sob o domínio mulçumano, o comércio
entre Europa e Ásia declinara subitamente.
Nem por terra nem por mar os mercadores cristãos conseguiam passagem
para as rotas que levavam à Índia e a China – de onde provinham as especiarias
usadas para conservar alimentos e também os artigos de luxo e para onde se
destinavam as mercadorias mais valiosas.
Por consequência, as cidades de Gênova e Veneza entraram em declínio,
enquanto portugueses e espanhóis aproveitaram sua posição geográfica para o
estabelecimento de rotas alternativas, chegando a lugares como África, Índia e
América pela rota do Oceano Atlântico.
Em 1494, para evitar conflitos entre o reino de Portugal e o
recém-formado reino da Espanha, foi estabelecido o Tratado de Tordesilhas, que
dividia o mundo entre as duas potências. No século XVI, esses dois países
tornaram-se os mais poderosos do mundo.
A Europa pega fogo – No período de 50
anos, de 1500 a 1546, sete papas passaram pelo Vaticano:
Alexandre VI (1492 – 1503).
Pio III (1503).
Júlio II (1503-1513).
Leão X (1513-1521).
Adriano VI (1522-1523).
Clemente VII (1523-1534)
Paulo III (1534-1549).
Em média, cada um deles reinou sete anos.
Com raras exceções, esses papas não honraram o nome de Deus nem o cargo
que ocupavam.
A começar com o papa da “descoberta” do Brasil Alexandre VI, que se
relacionou com uma senhora da nobreza romana, Vanozza de Cataneis, da qual teve
quatro filhos entre eles o tristemente famoso César Bórgia que assassinou o
marido da irmã e ela própria, Lucrécia Borja.
Os outros papas eram escandalosamente nepotistas e amantes do fausto e
do poder. Os dois que mais prometiam tiveram pontificado muito curtos – Adriano
VI (21 meses) e Pio III (25 dias).
Foi o papa Alexandre VI quem traçou a linha de Tordesilhas, sete anos
antes da “descoberta” do Brasil, que separava as zonas de influência portuguesa
e espanhola na esperança de acabar com a disputa entre os dois grandes países
da época.
Foi nesse ambiente de profunda decadência doutrinária e moral que
surgiram quase que simultaneamente, alguns movimentos espontâneos de
reforma religiosa em vários países da Europa.
Na verdade, esses esforços de reforma da igreja começaram bem antes da
expedição de Cabral, com João Wycliffe (1320-1384), na Inglaterra, e João Huss
(1369-1415), na Tchecoslováquia. Wycliffe é conhecido como a Estrela D’Alva da
Reforma.
Outra tentativa de reforma, de caráter mais regional e mais moral,
aconteceu na última década do século XV com o dominicano Jerônimo Savanarola
(1452 – 1498), na cidade de Florença.
Tanto Huss como Savanarola foram condenados à morte, este aos 46 anos,
por ordem do papa Alexandre VI, e aquele aos 43 por ordem do papa Alexandre V.
A soma de todos os esforços da igreja realizados na primeira metade do
século XVI, na Inglaterra, Escócia, Países Baixos, França, Alemanha, Suíça e
Prússia, deu origem à segunda grande cisão da Igreja Cristã.
O primeiro cisma ocorreu 463 anos antes, com o nascimento da Igreja
Católica Ortodoxa, também chamada Igreja Oriental. Trata-se da Reforma Protestante, levada a cabo por homens como Martinho
Lutero (1483-1546).
Úlrico Zuinglio (1484-1531). Felipe Melancton (1497-1560). João Calvino
(1509 a 1564) e John Knox (1514-1572).
A data mais importante da reforma é 31 de outubro de 1517, quando Lutero
protestou publicamente contra o abuso na venda de indulgências, com a afixação
de suas Noventa e Cinco Teses à porta da igreja do castelo de Wittenberg, na
Alemanha, à época do pontificado de Leão X.
É bom lembrar que Lutero nasceu 17 anos antes da “descoberta” do Brasil
e proclamou a reforma 17 anos depois.
Martinho Lutero – A tradição Luterana
tem início com Martinho Lutero (1433-1546), na Alemanha.
Aos 18 anos, em 1501, foi enviado por seu pai, que desejava torna-lo um
advogado, para a Universidade de Erfurt. Mas Lutero tinha consciência de sua própria
miséria.
O fato decisivo que o levou a ingressar, em 1505 no mosteiro dos cônegos
agostinianos foi o medo da morte, decorrente de uma violenta tempestade com que
foi surpreendido quando retornava de sua casa para universidade.
No entanto, mesmo no mosteiro, ele se sentia incomodado e andava sempre
triste por causa de seus pecados. A partir de 1512, depois de concluir seu
doutorado em Teologia,
Lutero começou a pregar na Universidade de Wittenberg
sobre Salmos e sobre as Epístolas aos Romanos, Gálatas e Hebreus.
Ao estudar as Escrituras, Lutero percebeu que a culpa que o consumia não
poderia ser removida nem mesmo se ele fizesse ainda mais penitências, e o deus
que ele tanto temia não era o Deus que Cristo tinha revelado: “Noite e dia eu
ponderei até que vi a conexão entre a justiça de Deus e a afirmação de que o
justo viverá pela fé.
Então eu compreendi que a justiça de Deus era aquela pela qual pela
graça e pura misericórdia, Deus nos justifica através da fé.
Com base nisso ele sentiu estar renascido e ter passado através de
portas abertas para dentro do paraíso.
Toda Escritura teve um novo significado, e, se antes a justiça me enchia
de ódio, agora ela se tornou para mim inexprimivelmente doce, em um maior amor.
Esta passagem de Paulo se tornou para mim um portão para o céu”.
Desse modo, Lutero desvencilhou-se da ideia medieval de que o homem se
faz justo e entendeu que as Escrituras ensinam que Deus declara pecadores
justos com base na perfeita obediência de Cristo, recebida somente por fé.
Compreendeu também que a doutrina da justificação pela graça, por meio
da fé, é “o artigo pela qual a igreja se mantém ou cai”.
Além de professor das Escrituras, Lutero era o pastor da igreja da
cidade Wittenberg e a partir desse entendimento, começou a pregar sua fé recém-descoberta
para a congregação.
Mas ao mesmo tempo, o monge dominicano João Tetzel (1465-1519), representante
do papa Leão X, vendia indulgências na Alemanha. Para Lutero, tal prática era
uma perversão do evangelho.
Segundo de conta, em 31 de outubro de 1517, ele afixou na porta da
igreja do castelo de Wittenberg, o debate para o esclarecimento do valor das indulgências
noventa e cinco teses, o que marcou o princípio da Reforma Protestante.
Esse tratado foi copiado, impresso e, em duas semanas se espalhou por
toda Alemanha, e em dois meses, por toda Europa.
Os eventos se sucederam com rapidez. Em 1518, Frederico III, eleitor da Saxonia
(1563-1525), deu seu apoio a Lutero, que, em 1519, participou de debate de
Leipzig.
Em 10 de dezembro de 1520, Lutero queimou os livros de diretos canônicos
e a bula papal que o ameaçava de excomunhão.
No início de 1521, ele foi convocado a Worms, perante o imperador do
sacro império, Carlos V (1500-1558), e os príncipes da Alemanha, para dar
contas de seu ensino.
Depois de dois dias de debate, em que o que estava em jogo era a
autoridade das Escrituras, ao ser instado a retratar-se e retornar à comunhão
com Roma, Lutero exclamou:
“Já que me pede uma resposta simples, darei uma que
não deixa margem a dúvidas: A não ser que alguém me convença pelo testemunho
das Escrituras Sagradas ou com razões decisivas, não posso me retratar.
Pois não creio nem na infalibilidade do papa, nem na dos concílios,
porque é manifesto que frequentemente se tenha equivocado e contradito.
Fui vencido pelos argumentos bíblicos, que acabo de citar e minha consciência
está cativa à palavra de Deus.
Não posso e não quero retratar-me, porque é perigoso e não é certo agir
contra sua própria consciência. Que Deus me ajude. Amém”.
Era a noite de 18 de abril de 1521 e o novo dia raiou para a
cristandade. Em 1529, os príncipes católicos reuniram-se em torno de uma
resolução que impedia a introdução da reforma em seus territórios, mas
reclamavam liberdade de cultos romanos nos territórios conquistados pelo
movimento reformador.
A recusa solene dos príncipes evangélicos, como se chamavam, de
concordar com essa imposição tornou os reformadores conhecidos como “protestantes”.
Por fim, um dos grandes feitos de Lutero foi traduzir com um grupo de
colaboradores toda a Escritura para o alemão. Essa edição foi publicada em
1534.
Ele trabalhou aperfeiçoando-a até o ano de sua morte. E, por essa época,
sua influência já se havia espalhado não só pela Alemanha, mas por parte da
Holanda, Suécia, Dinamarca e Noruega. Lutero foi sucedido por seu amigo Filipe Melanchton (1497-1560).
Bibliografia:
FERREIRA Franklin. A Igreja Cristã
na História - Das Origens aos Dias Atuais. Edições Vida Nova. São Paulo, 2013
CEZAR, Elben M. Lenz. História da
Evangelização do Brasil – Dos Jesuítas aos Neopetencostais. Editora Ultimato.
Minas Gerais, 2ª edição, agosto de 2.000
MELO, Esdras Cabral de. 500 Anos da Reforma Protestante – Causas Consequências
Contribuições. Editora Palavra de Vida, Pernambuco, 2017
Bíblia de Estudo da Reforma
OLSON Roger. História da Teologia
Cristã – 2.000 de Tradição e Reformas. Editora Vida. São Paulo, 2001
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